Brasil pode se tornar celeiro de novas variantes do coronavírus, alertam especialistas

Especialistas ouvidos pelo Jornal Nacional dizem que a falta de isolamento social, a grande circulação do vírus e a vacinação lenta podem tornar o Brasil um celeiro de novas variantes.
Vacinação lenta, altíssimas taxas de contaminação, políticas de isolamento social ineficientes. Os cientistas dizem que esses três fatores, atuando ao mesmo tempo, podem tornar o Brasil uma espécie de fábrica de novas variantes do coronavírus, como a P1, que provocou uma tragédia em Manaus no fim de 2020, e que agora, os pesquisadores já sabem, tem um poder muito maior de contaminação.
“Ele gruda com mais facilidade e invade a célula com mais facilidade. Com isso, um espirro ou uma simples respiração ofegante espalha uma quantidade de vírus muito maior e, com isso, o vírus, que já tem mais facilidade para infectar outra pessoa, vai se espalhar”, explica o pesquisador do laboratório de Virologia da USP José Eduardo Levi.
Mas de que forma uma variante do coronavírus, como a P1, aparece? Ao entrar numa célula, o vírus produz milhares de cópias para se espalhar. Mas nem todas ficam exatamente iguais. Algumas são reproduzidas com erros, que podem deixar o vírus mais fraco ou com chances ainda maiores de sobreviver. Quanto mais gente for sendo contaminada, mais esse processo vai se repetindo, e mais variantes poderão surgir.
Desde o início da pandemia, já foram identificadas quase mil variantes do coronavírus no mundo - entre 80 e 100 delas só no Brasil - como a P2 e a N9. Mas o biologista molecular da USP, José Eduardo Levi, ressalta que, neste momento, o mais urgente é conter a P1.
“Baixar o número de casos não só para diminuir o estresse do sistema de saúde, mas também para diminuir a circulação da P1 e, com isso, minimizar a chance da gente ter mutações de escape às vacinas”, afirma Levi.
O virologista da Universidade Feevale, Fernando Spilki, explica que a mistura de uma grande circulação do vírus com uma vacinação lenta, pode deixar vulneráveis não só as pessoas, mas também a eficiência das próprias vacinas num futuro próximo.
“Essas pessoas imunizadas, especialmente quando elas tomaram apenas uma dose, ainda não estão completamente imunizadas, elas ainda podem se infectar. E na presença de uma imunidade que ainda não é robusta podem ser selecionados nessas pessoas genomas com algumas mutações, ou mesmo já mutantes que tenham algum tipo de resistência, ainda que parcial à vacina, e que se passassem para uma outra pessoa vacinada se extinguiriam. Mas como eles ainda podem encontrar muitos indivíduos suscetíveis, a gente pode ter uma perpetuação dessas variantes”, explica Fernando Spilki, virologista e professor da Feevale.
O Brasil tem grupos de cientistas que desde o início da pandemia vêm fazendo o sequenciamento genético do coronavírus e identificando novas variantes. Mas eles dizem que essa vigilância só poderá ajudar o Brasil, de fato, se tivermos a combinação: distanciamento social bem planejado e vacinação para todos.
“Com a quantidade de vírus que está solta, os vírus podem infectar outras pessoas, podem se recombinar, podem reinfectar outras pessoas, podem surgir novas mutações. A maior parte dessas mortes poderiam ser evitadas se a gente tivesse vacina, se a gente tivesse medidas adotadas por distanciamento social. A gente não pode achar normal 3 mil pessoas morrendo por dia”, alerta Ana Tereza Vasconcelos, pesquisadora do Laboratório Nacional de Computação Científica.